domingo, 8 de março de 2009

Exposição Individual de Fábio Tremonte - Convite + Texto




“A ordem é ao mesmo tempo aquilo que se oferece nas coisas como sua leitura interior, a rede secreta segundo a qual elas se olham de algum modo umas às outras e aquilo que só existe através do crivo de um olhar, de uma atenção, de uma linguagem.”
FOUCAULT


Como um viajante - ou expedicionário - a coletar fragmentos de sua jornada você, Fábio Tremonte, apresenta-nos um ajuntamento de desenhos, colagens, fotografias, pinturas; uns pedacinhos de papel rasgado, amassados e dobrados, duas alças de uma sacola de papel e um par de pequenos e indecifráveis objetos azuis. Compõem também sua mesa, ou melhor, a sua “tábua de trabalho”, cadernos fechados ao nosso olhar (um chamado céu e o outro mar), um bloco de anotações com folhinhas de alguma espécie vegetal desenhadas. Na parede, um retalho de tecido combinado com uma fotografia de mar leva o nome de Marie. O tecido com suas listras azuis e horizontais dá continuidade à imensidão do mar. Parece que tudo faz parte de uma grande paisagem, dispersa e resumida.
F., essas coisas todas postas sobre sua mesa ou postas na parede são como aquele quadro que permite ao pensamento operar com os seres de uma ordenação, uma repartição em classes, um agrupamento nominal , são como aquela tábua de que nos fala Foucault. De certa forma você despedaça a paisagem com seu olhar de zoom, a atenção pelo ínfimo. Lembro-me que há duas pedras cinzentas bem pequeninas e seu nome é troféu, um troféu que numa visada rápida talvez perdesse de vista, ou o perdesse de vista ao concentrar-me nos vazios da mesa que desenham um gride. Ah! A geometria...E também a síntese. Sua paisagem é construída sobre tudo por verticais e horizontes como os quadros de Mondrian. O desejo de síntese de certa forma liga-se a uma vontade de universalização – e à utopia, é claro – opõem-se ao fragmentar, ao particular (das partículas).
Você recompõe um mundo possível a partir dos cacos que dispõe sobre aquela mesa niquelada, encerada, envolta em brancura, faiscante sob o sol de vidro que devora as sombras.
Mas ainda há sombras, há sim. O livro das nuvens que oferece uma espécie de resumo de tudo isso. Nele o desenho rompe a geometria, mas está fatalmente enquadrado por ela, no papel. É um oximoro como o seu trabalho é, como o mundo e as pessoas acabam sendo.
Sua relação, por vezes subterrânea com a nossa profícua tradição geométrica, essa vontade construtiva. Sobre sua mesa, essa geometria leve de papel é vulnerável: não resiste ao passar distraído da moça que faz vento. Mas ainda podemos ver rastros da paisagem recolhida afetuosamente, por gostar e nada mais.

Lais Myrrha
Março de 2009

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